sexta-feira, 25 de maio de 2007

Arquivo digital de Glauber


O acesso à obra do maior cineasta brasileiro pelo público nem sempre é simples: são poucos os filmes de Glauber Rocha disponíveis em DVD, e raras as oportunidades de vê-los nos cinemas. Mas agora tudo o que Glauber produziu dentro e fora do cinema está sendo restaurado, digitalizado – e em breve estará disponível na Internet.
Um sobrado no Rio guarda riquezas da cultura nacional. Lá tem muito da história de um dos maiores artistas do cinema brasileiro: um arquivo de mais de 100 mil documentos sobre a vida e a obra de Glauber Rocha – diários escritos durante o exílio nos anos 70, romances e filmes.
Glauber Rocha foi uma espécie de gênio rebelde que transformou o cinema brasileiro. “Cinema é para ver e é para ouvir, quer dizer, o diretor não deve falar do filme, não”, ele disse em uma entrevista.
Seus filmes mostram uma realidade alegórica e muitas vezes delirante. Glauber fez o Cinema Novo; nos anos 60, valorizou a fotografia, criou uma linguagem-limite, desconstruiu narrativas para formar um sentido novo e livre. E conseguiu, no cinema, dizer muito sobre o Brasil: da denúncia da miséria à complexidade das faces políticas de “Terra em Transe”.
Um de seus curtas mais polêmicos foi sobre a vida do pintor Di Cavalcanti. Com uma equipe de filmagem, ele entrou no velório do artista morto, e tirou o lenço que cobria o rosto do pintor. Depois de interditado por 20 anos, a pedido da família do pintor, o curta-metragem foi premiado em Cannes.
Os arquivistas querem agora divulgar a obra de Glauber Rocha. Em um ano, todos os documentos, anotações pessoais, fotos e até peças de teatro escritas pelo artista vão estar disponíveis na Internet.
Os originais são de acesso restrito – somente a equipe de restauradores pode tocá-los. “Um erro pode ser fatal, você pode perder informação que muitas vezes é única”, justifica a museóloga Roberta Leite.
O trabalho foi iniciado pela mãe de Glauber, dona Lucia. Aos 88 anos, incansável, ela reuniu tudo o que há de memória concreta sobre a vida e a obra do filho. “Eles estavam embolados, jogados no cesto. Eu pegava os documentos, botava em cima da mesa, botava um paninho fino com um papel em cima e passava a ferro bem frio. Ficava horas fazendo aquilo. Depois eu embalava numa folhinha de papel e punha em cima do meu guarda-roupa”, mostra Lucia Rocha.
Sobre o projeto de digitalização, ela define: “É um sonho, e o sonho é a única coisa que ninguém pode perder”.


FONTE: Jornal da Globo

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